A salvação que Jesus Cristo conquistou para nós não pode ser comprada com 10% mensais de seu salário...

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Deixando de Brincadeira



Por Avelar Jr

Conheço um genuíno servo de Cristo. Uma pessoa que realmente se preocupa com as coisas de Deus e com a vontade dele em sua vida. Conversamos bastante. Ele havia sido muito religioso, fanático, bem visto em seu meio, prestigiado e popular —um líder. O problema é que o meio que o acolhia tão bem era fanático, herético, frenético, ávido por novidades e estrelas ministeriais e despido de conhecimento de Deus e de sua palavra. Eles se moldavam um ao outro: cegos guiados por cegos andando para o abismo.

Com o tempo, Deus abriu seus olhos. Ele percebeu que estava num pedestal de glória humana, cheio de religião e sensações mas vazio de verdade. Vestiram-lhe a fantasia de super-herói. E ele se deixou vestir e dominar pelo personagem, pela máscara e pela canção da roda. Ao contemplar a verdade, sua atitude mudou. Tornou-se discípulo, aprendiz e encontrou seu lugar de servo.

Findaram-se sua liderança, seu programa de rádio, seu sucesso ministerial. Pagaram-lhe com preconceito, ingratidão, incompreensão e ostracismo. Mas que importa? O Dia das Bruxas passou! Deus mudou-o de sua máscara e de seus trajes espalhafatosos que faziam a alegria dos meninos em uma completa novidade de vida, nunca antes experimentada. E o que antes era noite de “gostosuras e travessuras” deu lugar à dura carteira do discipulado diário do Mestre Jesus.

E ele às vezes se sentia triste e se perguntava: Onde está aquele calor que eu sentia? Onde as emoções arrebatadoras? Por que tudo parece tão frio e distante? Os aplausos, os cumprimentos, o assédio, a euforia, os folguedos... Num momento tudo se calou na simplicidade e na calmaria do úmido alvorecer.

Começar cada manhã parecia trabalhoso (— Só mais cinco minutos, por favor!). Agora levantava sozinho para ir à escola. E já não tinha mais consigo aqueles cuja noite de Dia das Bruxas não tem fim, que se contentavam em brincar com suas fantasias, com suas roupas de mentiras, esperando ganhar doces por se vestirem delas.

Mas ele sabia que, embora fosse difícil acreditar, não estava só. Pois seu Mestre lhe sorria no oculto e lhe oferecia um pouco de sua companhia em cada momento, em cada brisa, em cada canto de pássaro, em cada nota musical, mesmo no silêncio; na brisa refrescante e em cada flor que coloria e perfumava o caminho. Era difícil se desembriagar, se desacostumar, quando tudo agora parecia tão simples e tão diferente, tão menos óbvio. Era triste não sentir o sabor daquilo que parecia doce mas que era apenas uma brincadeira de menino.

Estava acostumado a pensar que vivia a mil por hora quando, na verdade, nunca havia saído do lugar. Enxergar e deixar de brincadeira faz mesmo muita diferença.


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Avelar Jr é colunista no Púlpito Cristão

terça-feira, 2 de novembro de 2010

Grandeza moral e audácia espiritual.




“Esta hora exige grandeza moral e audácia espiritual”. Com essas palavras, Abraham Joshua Heschel, um dos maiores pensadores judeus do século XX, encerrou um telegrama ao presidente John Kennedy. Ele cobrava ações concretas sobre direitos civis dos negros na década de 60. Depois dessa mensagem, mesmo sendo branco e judeu, Heschel marchou pelas ruas de Selam, Alabama, ao lado de cristãos como Martin Luther King e Andrew Young.

O Brasil também precisa de “grandeza moral e audácia espiritual”. Os problemas seculares que envergonham a nação continuam intocados: injustiça social, destruição da rede hospitalar pública, favelização das grandes metrópoles, abandono do pequeno produtor rural, falta de políticas de segurança pública e outras mazelas. O “florão da América” aparece com colocações medíocres em alguns índices de qualidade de vida da ONU; ganharia campeonatos de mortes no trânsito, de assassinatos à mão armada e de imigrantes ilegais barrados ou deportados de países como Inglaterra e Estados Unidos. A imprensa faz sua parte denunciando a vergonha nacional e as ONG’s lutam para reverter algumas realidades.

E os evangélicos? Existem heróicos esforços de gente que se embrenha pelos sertões abrasante do Nordeste, pela selva da Amazônia e nas periferias e morros pobres. Como movimento, os evangélicos continuam patinando em questiúnculas teológicas, eternamente debatendo pontos e vírgulas de textos controversos. E sobram exorcistas que sabem “amarrar demônios”, treinam-se evangelistas que salvam almas. A atuação evangélica como sal que evita processos de desintegração moral, ética, política, é praticamente nula e o Brasil continua imoral, pobre, violento e atrasado.
Para que a presença evangélica se torne eficaz, é necessário repensar alguns pressupostos teológicos:

A paternidade divina

Enquanto a paternidade divina não for conhecida, vivenciada e celebrada pelos crentes, sua espiritualidade se manterá utilitária, e pouco se conhecerá sobre graça. Infelizmente se alastram superstições medievais; amuletos que supostamente “dão um ponto de contato” para a fé; correntes e campanhas que pretendem gerar “orações fortes”. Pouco se fala da gratuidade do amor paterno, que sabe dar boas dádivas aos seus filhos; quase não se ouvem sermões sobre a inutilidade dos sacrifícios diante da grandeza do cuidado de Deus que provou seu amor ao entregar seu Filho, enquanto os homens ainda eram seus inimigos.

A natureza humana

Os evangélicos ainda mantêm uma idéia preconceituosa sobre os efeitos do pecado na raça humana. Acredita-se que as pessoas são tão pecadoras que se deve manter distância dos “incrédulos”. Com essa visão de mundo, os crentes são inclinados a viver em guetos, e a grande missão da igreja resume-se em tirar gente do mundo e trazê-las para dentro das igrejas, único ambiente que se acredita puro na face da terra. Essa visão descarta a compreensão de que, mesmo caídos, os homens ainda conservam a imagem de Deus. Significa que as pessoas que ainda não se converteram a Cristo, mesmo contaminadas pelo pecado, elas têm uma dignidade ímpar e podem ser honradas. Por isso, mesmo sem ser cristãos, médicos, juízes, escritores, poetas, músicos, políticos e policiais poder ter comportamentos e atitudes que são nobres e merecem a atenção de todos, inclusive dos crentes.

A missão da igreja

Ela não se constitui em salvar apenas as almas dos homens. É preciso que eles sejam salvos como pessoas. Isso significa que a missão da igreja não deve se resumir em preparar as pessoas para irem para o céu, mas em tornar o mundo em que vivem num lugar mais humano, mais justo e mais misericordioso. A missão da igreja também busca mudar as circunstâncias que aprisionam as pessoas. Não basta salvar a alma dos escravos, é preciso acabar com a escravidão; não basta resgatar os favelados da idolatria, é preciso desmantelar um sistema econômico que os condena à miséria; não basta condenar o aborto, é preciso dar às gestantes condições para sustentar filhos indesejáveis.

Por mais que seja necessário um avivamento de oração, piedade e leitura da Bíblia, ele será inócuo se a igreja não se conscientizar que Deus é Pai, que os crentes são apenas pecadores salvos pela graça e sua missão é tão terrena quanto espiritual.


Soli Deo Gloria.

Ricardo Gondim.